As mortes neonatais dizem respeito a quadros letais apresentados por bebês durante seus primeiros 28 dias de vida. Um levantamento da Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que aproximadamente 2,3 milhões de recém-nascidos morreram com essa idade só em 2022. Isso equivale a uma média de 6,5 mil mortes por dia, e quase metade (47%) de todas as mortes envolvendo menores de 5 anos.
Esse cenário internacional é bem melhor do que aquele vivido em 1990, quando o número de óbitos de bebês chegou à marca de 5 milhões. Porém, ainda está longe de alcançar o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 3.2 da OMS, que prevê reduzir a taxa de mortalidade neonatal para 12 a cada 1.000 nascidos; hoje a média é avaliada em 17,3 mortes para cada 1.000 nascimentos.
No Brasil, o Painel de Monitoramento da Mortalidade Infantil e Fetal, do Ministério da Saúde, indica que 21.224 óbitos neonatais foram registrados em 2023. Trata-se do menor valor da série histórica, que considera os registros a partir de 1996. Naquele ano, o total contabilizado foi de 53.133, o que revela uma queda de 60% em 27 anos.
Mas, afinal, quais são as complicações que mais causam mortes neonatais? Conheça seis delas e como evitá-las.
1. Prematuridade e baixo peso
As principais complicações por trás da morte de recém-nascidos são a prematuridade e o baixo peso. O primeiro termo refere-se aos bebês nascidos com menos de 37 semanas de idade gestacional e o segundo àqueles que nascem pesando menos de 2,5 kg, independentemente do período da gravidez.
A OMS estima que, a cada ano, quase 15 milhões de recém-nascidos nascem prematuros, e mais 20 milhões nascem abaixo do peso considerado ideal. Tais condições costumam estar relacionadas a um desenvolvimento fetal incompleto, o qual pode comprometer o funcionamento de diferentes sistemas.
Pulmões imaturos, por exemplo, exigem que o bebê passe por um intenso tratamento de ventilação mecânica. O mesmo pode ser dito a respeito de intestinos não desenvolvidos, incapazes de absorver o leite materno ou do cérebro prematuro, que impede o recém-nascido de ter o instinto de sugar os mamilos da mãe para mamar.
Esses quadros dificultam o crescimento nos primeiros dias de vida e aumentam a suscetibilidade a infecções. Em alguns casos, os problemas podem perdurar ao longo da vida.
2. Complicações do parto
As complicações do parto também figuram entre os principais fatores relacionados às mortes neonatais. Isso porque a asfixia e o trauma podem levar a quadros de falta de oxigenação no cérebro antes, durante e depois do nascimento.
Segundo o Ministério da Saúde, em média, 20 mil crianças nascem todos os anos com uma baixa oxigenação cerebral no Brasil. Isso pode ocorrer em decorrência de nós no cordão umbilical, hipotensão materna e dificuldade do bebê para chorar (impedindo que os pulmões sejam preenchidos pelo ar).
Para além do risco de óbito nos casos mais graves, essas ocorrências ainda podem causar deficiência cognitiva, cegueira e surdez. Daí a importância de ter um profissional especializado em medicina neonatal na sala de parto.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), cerca de 10% do total de recém-nascidos e mais de 60% dos prematuros precisam de ventilação pulmonar na sala de parto para restabelecer a respiração. Quando o procedimento é realizado por profissionais treinados, a partir de técnica adequada e ainda no primeiro minuto de vida, a maioria dos bebês se recupera.
3. Sepse neonatal
Todos os recém-nascidos apresentam um sistema imunológico pouco desenvolvido, mesmo aqueles que nasceram a termo e com peso ideal. Isso os torna mais suscetíveis a infecções, as quais podem ocorrer antes, durante e depois do parto. Em certos casos, esses problemas podem evoluir para uma sepse, um tipo de infecção generalizada.
Os sintomas típicos incluem a diminuição da atividade espontânea, sucção menos vigorosa, perda de peso, apneia e instabilidade térmica (com episódios de hipo ou hipertermia). O tratamento envolve o uso de medicamentos antibióticos e a observação.
A melhor forma de evitar essa complicação é fazer o pré-natal adequadamente na gravidez. Exames ao longo dos três trimestres de gestação ajudam a equipe médica responsável a identificar de maneira precoce eventuais riscos e propor medidas para minimizá-los.
4. Anomalias congênitas e malformações
À medida que a idade média das gestantes aumenta, tem sido observado também um crescimento no número de gestações atípicas. Esses casos são marcados pelo desenvolvimento de fetos com anomalias ou malformações, como cardiopatias, membros ausentes e defeitos no fechamento do tubo neural (espinha bífida, por exemplo).
Todos os anos, nascem cerca de 8 milhões de crianças com alguma anomalia congênita no mundo, segundo a OMS. Estima-se ainda que elas podem causar até 10% de todas as mortes entre os recém-nascidos.
Os exames pré-natais também auxiliam no processo de antecipação desses diagnósticos e, consequentemente, do seu tratamento. Fora dos centros urbanos, onde há menor disponibilidade de avaliação por médicos especialistas, as crianças correm mais risco de vida ou de manterem um prognóstico negativo mesmo depois de passarem por intervenções medicamentosas e cirúrgicas.
5. Síndrome desconforto respiratório
A síndrome do desconforto respiratório (ou síndrome da angústia respiratória) é uma condição associada a crianças prematuras. Nesse quadro, o pulmão ainda em desenvolvimento não produz uma substância denominada surfactante. Essa mistura de lipídios e proteínas tem como principal função facilitar a troca gasosa no pulmão.
O processo envolve a passagem do oxigênio para o sangue a partir dos alvéolos e a transferência do dióxido de carbono para o pulmão. Seu mau funcionamento pode trazer prejuízos ao organismo e às atividades celulares.
Dentre os sintomas típicos estão a respiração acelerada, ruídos ao respirar e a pele azulada nos lábios e dedos da criança. Geralmente, o quadro surge nas primeiras 24 horas após o nascimento.
No passado, a síndrome já foi uma grande antagonista da medicina neonatal. Hoje, com os avanços da ciência farmacêutica, tornou-se possível produzir o surfactante pulmonar a nível comercial, o que ajuda no tratamento desses quadros.
6. Infecções congênitas
As infecções congênitas são aquelas transmitidas da mãe para o feto durante a gestação ou na hora do parto.
Dentre as principais, estão:
Em indivíduos com baixa imunidade, como os recém-nascidos, essas patologias podem se manifestar de maneira muito intensa. O tratamento também tende a ser mais complicado se comparado a um adulto.
A melhor forma de se prevenir contra essas infecções é por meio do cronograma pré-natal. Os exames são capazes de identificar com antecedência os riscos e preparar a equipe para melhor atender mãe e filho no pós-parto.
Como evitar as mortes neonatais?
Evitar mortes neonatais passa, antes de tudo, por garantir acesso à saúde, promover o acolhimento das famílias e combater a desinformação. O bem-estar do recém-nascido é um reflexo direto do cuidado com a gestante, do ambiente do parto e do acompanhamento nos seus primeiros dias de vida.
As causas das complicações neonatais são multifatoriais. Embora fatores genéticos desempenhem um papel considerável, grande parte das mortes entre esse grupo tem relação com a não realização de um acompanhamento adequado, tanto durante a gestação quanto após o parto.
Vale destacar que tal ocorrência não é, necessariamente, intencional. Muitas vezes, ela deriva da desinformação, bem como da dificuldade de acesso aos serviços de saúde.
O ideal é que a orientação médica seja iniciada logo que a mulher manifesta o desejo de engravidar. Isso torna todo o processo de acompanhamento da gestação muito mais seguro e tranquilo.
Consultas regulares, exames de pré-natal, orientações sobre alimentação, saúde mental e preparo para o parto são fundamentais para garantir que a gravidez evolua em boas condições para a mulher e o feto.
Logo após o nascimento, é crucial que a criança passe ainda por uma avaliação clínica detalhada que possa detectar situações de risco. Isso inclui os testes do pezinho, da orelhinha (auditivo), do coração (oximetria de pulso), do olhinho e da linguinha. Nesse momento, também costuma ser indicado o contato pele a pele com a mãe, o que pode contribuir para a imunidade do bebê, além de ajudar a estabilizar a sua temperatura corporal e favorecer o início da amamentação.
Após a alta hospitalar, que geralmente ocorre em até 48 horas, os cuidados continuam. É importante que os pais retornem com o bebê ao ambulatório entre 48 e 72 horas após a alta para uma nova avaliação.
A SBP recomenda que, no primeiro mês de vida, os bebês realizem pelo menos três consultas médicas. Do segundo ao sexto mês, a frequência deve ser de uma vez ao mês. Já a partir do sétimo mês de vida, as visitas podem ser espaçadas a cada dois meses.
Revisão técnica: Romy Schmidt Brock Zacharias (CRM 94608), coordenadora médica de Neonatologia do Hospital Israelita Albert Einstein